Resenha de “The Green Knight”: Encerramento de ciclos e viagens solitárias

Nathan Couto
6 min readMar 15, 2022

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Nascido em Wisconsin em 1980, David Lowery é um escritor e diretor americano conhecido pelo seu trabalho em “Sombras da Vida”. Aos 19 anos escreveu e dirigiu seu primeiro filme, “Lullaby — A Última Canção” e teve seu grande sucesso com seu primeiro longa-metragem, “St. Nick”. Um dos seus trabalhos originais “Ain’t Them Bodies Saints“(2013), com Rooney Mara e Casey Affleck , foi nomeado ao Grande Prêmio do Júri no Festival de Cinema de Sundance de 2013. Em 2016 dirigiu e co-escreveu “Meu Amigo, o Dragão“, um live-action baseado em um musical da Disney de 1977 com o mesmo nome.

O seu último grande lançamento é o épico de fantasia The Green Knight ou “O Cavaleiro Verde”, cujo dirigiu, escreveu e produziu. O filme se passa no medievo e é protagonizado por Dev Patel, Alicia Vikander, Joel Edgerton, Sarita Choudhury e Kate Dickie. “O Cavaleiro Verde“ estava programado para estrear mundialmente no South by Southwest em Março de 2020 e o lançamento em 29 de Maio de 2020, porém, devido à pandemia do COVID-19, a estreia e o lançamento foram cancelados. Em 30 de julho de 2021 foi lançado nos cinemas, mas demorou mais um pouco até chegar no Brasil. Ficou disponível para aluguel em algumas plataformas pagas e somente em 2022 passou a fazer parte do catálogo do Prime Video.

A obra é uma releitura fantástica da história medieval de “Sir Gawain e o Cavaleiro Verde”. A adaptação é baseada em um conto de autor desconhecido que posteriormente virou um romance e faz parte do Ciclo Arturiano (Sir Gawain é sobrinho do Rei Artur e um dos cavaleiros da Távola Redonda).

O primeiro plot do filme começa quando o Cavaleiro Verde, um ser místico metade árvore metade humano, propõe um jogo a um dos cavaleiros mais ousados e de coração mais selvagem. O desafio proposto era de atingi — lo com somente um golpe, e assim, o candidato terá glória e riqueza, mas o campeão deve se comprometer em depois de um ano, se encontrar novamente com o Cavaleiro Verde para que o deixe retribuir o golpe de volta.

Sir Gawain decide então entrar no jogo e aceitar o desafio, recebe a Excalibur, a lendária do Rei Artur. Em seguida, o Cavaleiro Verde se ajoelha e Sir Gawain acerta de primeira um golpe em seu pescoço fazendo que a cabeça do homem árvore role pelo chão.

Sir Gawain satisfeito com seu ato, achando que tinha ganhado o jogo e terminado o serviço, se surpreende ao ver o temido Cavaleiro Verde se levantar e colocar a sua cabeça de volta no lugar e dizer que daqui a um ano retribuirá o mesmo golpe.

Vale lembrar que a direção de fotografia feita por Andrew Droz Palermo faz um excelente trabalho no filme, não somente em mostrar belas paisagens e sim contribuir com a narrativa do longa. Isso inclui truques de luzes e sombras ao redor dos personagens e ótimas cenas em noites escuras. Essas composições fazem com que se mostre somente um lado da face dos atores e isso — junto com os gestos — diz muito sobre o que tal personagem está sentido.

Após um ano se passar, Sir Gawain se encontra com Rei Artur e conversam sobre o seu futuro próximo encontro com o Cavaleiro Verde. Sir Gawain tem medo e se questiona se cumpre ou não a sua promessa, mas como quer passar a ideia de ser um homem de honra aos seus companheiros e habitantes de Camelot, decide seguir o seu caminho. O que sobressai nesse trecho, é a edição e montagem que é descompassada, bem rápida e com muitos cortes abruptos, ela serve para indicar o conflito interno do personagem principal.

A partir disso, acompanhamos o protagonista em sua viagem até seu encontro. O filme tem a grande habilidade de transformar isso em uma incrível jornada de autoconhecimento, com muitas reflexões acerca da moral, destinos e honra. Juntos aprendemos a lidar com essa situação ao lado do personagem principal.

Durante seu caminho Sir Gawain passa por diversos pormenores até chegar ao seu destino, o primeiro deles é ter que enfrentar um grupo de saqueadores que atrasam o seu percurso. Além disso, faz amizade com uma raposa, o mascote que estará junto a ele em sua jornada.

Nisso podemos destacar a excepcional direção de arte da obra: os figurinos dizem muito sobre o personagem, como por exemplo, a capa amarela que Sir Gawain usa durante a sua viagem. O amarelo — que nesse caso representa o brilho e luz — é bem destacado e gritante na composição, gerando até um contraste com a floresta verde musgo opaca e serve para indicar que sua caminhada será iluminada. A cenografia não fica fora disso pois faz uma ótima reconstrução de época e propõe uma maravilhosa ambientação.

O seu segundo obstáculo é a sua abordagem com um espírito que pede ajuda para encontrar a sua cabeça afundada em um lago. Essa cena funciona como uma grande metáfora da condição de Sir Gawain e garante até mesmo um belo estudo de personagem. Os problemas enfrentados por ele os ajudam a se reconhecer, compreender o seu processo e aceitar o seu destino.

Perdido, roubado e somente equipado com o seu machado, o filme passa a integrar elementos fantásticos. Quando em seu momento desolado o protagonista encontra gigantes que indicam onde irá encontrar ajuda.

A próxima minúcia que Gawain entre em conflito testa os seus limites. A dado momento, encontra mais dois novos personagens — um casal — em uma casa misteriosa que guarda alguns segredos. Eles o acompanham nos próximos minutos do filme, oferecem muita comida, indica o caminho que deve seguir adiante e espaço para dormir.

O problema é que o casal está apaixonado por Gawain, e isso põe em cheque seu relacionamento com Lady Bertilak, que é o amor de sua vida e uma prostituta (fato que não aceita e não lida muito bem).

Depois de um longo período dentro da misteriosa casa, Gawain vai seguir o seu percurso até encontrar o Cavaleiro Verde. Cabe aqui também enormes elogios a trilha sonora do filme que é totalmente impactante e épica. São usados instrumentos da música celta e grandes corais com várias divisões de vozes.

No final, é chegado o grande momento, Gawain consegue achar o Cavaleiro Verde que está prestes a acertar com o mesmo machado que o usou para golpeá — lo. Nesse momento Gawain pensa em desistir e imediatamente a sua vida passa diante de seus olhos, uma vida de mentira e cheia de dificuldades e descrenças, tudo isso por não ter honrado sua promessa. E então que finalmente Gawain aceita seu destino, se ajoelha, e sobem os créditos.

Em suma, “A Lenda Cavaleiro Verde” tem um lindo final subjetivo e não só se sai muito bem em vários aspectos da linguagem cinematográfica bem como nos presenteia com uma série de pensamentos permitindo que reflitamos sobre a obra durante dias. Para aqueles que gostam de épicos e fantásticos como Senhor dos Anéis e O Hobbit, ou longas medievais como Robin Wood e até mesmo filmes de lendas arturianas, com certeza não se arrependerá da escolha.

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Nathan Couto
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Written by Nathan Couto

Nascido no 5° dia do Século XXI, Bacharelando em Produção Cultural no IFRJ, músico instrumentista profissional e crítico de cinema.

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