Estudo de arquétipo: O nerd e suas representações no audiovisual.

Antigamente, o termo “nerd” era associado a um status inferior nas relações de poder, em que aqueles que se autodeclaravam ou eram considerados nerds eram frequentemente reprimidos por outros grupos, como os “bullies”. Hoje em dia, o conceito de nerd passou por uma ressignificação na cultura pop, adquirindo um status de “cool”. Ao contrário do passado, não há mais vergonha em ser nerd, e sim orgulho. No entanto, essa nova abordagem do arquétipo moderno também gera controvérsias, especialmente devido a traços de personalidade problemáticos que podem ser prejudiciais como elemento catártico.

No artigo “O nerd virou cool: identidade, consumo midiático e capital simbólico em uma cultura juvenil em ascensão”, de Patrícia Matos (2011), é discutido como o nerd passou de um estilo ridicularizado para uma fonte de orgulho. Segundo a autora:

“A definição atual de nerd o caracterizaria mais como uma pessoa que nutre alguma obsessão por um determinado assunto a ponto de pesquisar, colecionar coisas, escrever sobre e não sossegar enquanto não descobrir como funciona.” (MATOS, Patrícia)

O nerd se apresenta como uma autoridade em assuntos que lhe interessam e, consequentemente, pode se tornar o porta-voz de determinados produtos, por exemplo. No artigo, Matos (2011) menciona a autora Danielle Galvão, que defende a ideia de que, com a evolução da tecnologia, os nerds ganharam mais espaço, uma vez que eram dos poucos que tinham familiaridade com gadgets, computadores, notebooks e possuíam bom conhecimento de softwares. Por isso, esse grupo passou a ser visto como uma espécie de consultoria e passou a ser mais respeitado por sua expertise.

Junto a isso, também surgiu a ideia de que você poderia trabalhar para um nerd no futuro. A partir do sucesso de figuras como Bill Gates e Steve Jobs — que foram nerds desde o período escolar e se tornaram milionários — as pessoas passaram a acreditar que aqueles que foram oprimidos e ridicularizados na escola poderiam ser seus chefes no futuro.

Agora, o objetivo é destacar esses traços de comportamento no arquétipo dos personagens e suas possíveis variações em busca de um ethos do nerd dentro do campo audiovisual. Isso começa com o filme “A Vingança dos Nerds” e a série “The Big Bang Theory”, que são citados tanto no artigo quanto no vídeo-ensaio “The Adorkable Misogyny of The Big Bang Theory” (McIntosh, 2017). Conforme proposto por McIntosh, alguns personagens da série reproduzem atitudes de objetificação sexual, especialmente o personagem Howard.

Outra obra que apresenta grande parte desses traços é a sitcom “Scott Pilgrim Contra o Mundo”, em que Scott constantemente se coloca para baixo e não consegue aceitar o fato de que sua namorada tem ex-namorados. Existem também outras produções audiovisuais que apresentam esse arquétipo, como a série “Como Vender Drogas Online”. O protagonista Moritz se apresenta como empreendedor e geek, e tem como aspiração ser um bilionário nerd como Mark Zuckerberg, mostrando-se um sujeito egoísta e arrogante.

Em “Brilho Eterno de Uma Mente Sem Lembranças” e “(500) Dias com Ela”, os protagonistas têm a característica de um “Pick Me Boy”, um termo mais utilizado a partir de 2018. Essas pessoas costumam se autodepreciar para receber a satisfação do ego vinda de outra pessoa, além de serem manipuladoras e pegajosas. Além disso, em todo o enredo do filme “(500) Dias com Ela”, a história gira em torno do homem e não da mulher, e o personagem Hansen apresenta essas características em sua relação com Summer, assim como Joe se relaciona com Clementina em “Brilho Eterno de Uma Mente Sem Lembranças”.

Por fim, é importante destacar que existem outros atributos que podem ser associados a essas pessoas antes de adotarem o estilo nerd. Devemos considerar que os personagens podem ser exceção à regra, mas ao analisar a construção histórica, percebemos que o nerd também carrega o machismo em seu comportamento.

Referências Bibliográficas

MCINTOSH, Jonathan. The Adorkable Misogyny of The Big Bang Theory. Youtube, 31 ago. 2017. Disponível em: <https://youtu.be/X3-hOigoxHs>. Acesso em: 10 jun. 2022.

MCINTOSH, Jonathan. The Complicity of Geek Masculinity on the Big Bang Theory. Youtube, 29 set. 2017. Disponível em: <https://youtu.be/7L7NRONADJ4>. Acesso em: 10 jun. 2022.

BURGEMEESTER, Alexander. What Is A Pick Me Boy And How To Spot Him. The Narcissistic Life, 12 Jul. 2022. Disponível em: <https://thenarcissisticlife.com/pick-me-boy/>. Acesso em: 25 Jul. 2022.

Referências Audiovisuais

A VINGANÇA DOS NERDS; Direção: Jeff Kanew. Intérpretes: Robert Carradine, Anthony Edwards, Timothy Busfield. Roteiro: Steve Zacharias e Jeff Buhai. Produção: Interscope Communications e Zacharias-Buhai Productions. Estados Unidos: Twentieth Century Fox,1984. (90 min.)

THE BIG BANG THEORY; Criação de: Chuck Lorre e Bill Prady. Estados Unidos:
Chuck Lorre Productions e Warner Bros. Television, 2007–2019. son., color. Série exibida pela Warner.

SCOTT PILGRIM CONTRA O MUNDO; Direção: Edgar Wright. Intérpretes: Michael Cera, Mary Elizabeth Winstead, Kieran Culkin. Roteiro: Michael Bacall e Edgar Wright. Produção: Marc Platt Productions e Big Talk Productions. Estados Unidos: Universal Pictures, 2010. (112 min.)

COMO VENDER DROGAS ONLINE (RÁPIDO); Criação de: Philipp Kässbohrer e Matthias Murmann. Alemanha: Bildundtonfabrik e Netflix, 2019. son., color. Série exibida pela Netflix.

BRILHO ETERNO DE UMA MENTE SEM LEMBRANÇAS; Direção: Michel Gondry. Intérpretes: Jim Carrey, Kate Winslet e Tom Wilkinson. Roteiro: Charlie Kaufman. Produção: Anonymous Content e This Is That Productions. Estados Unidos: Focus Features, 2004. (108 min.)

(500) DIAS COM ELA; Direção: Marc Webb Intérpretes: Zooey Deschanel, Joseph Gordon-Levitt e Geoffrey Arend. Roteiro: Scott Neustadter e Michael H. Weber. Produção: Watermark e Dune Entertainment III. Estados Unidos: Fox Searchlight Pictures , 2009 (95 min.)